Nada de Novo no Novo Milênio
NADA DE NOVO NO NOVO MILÊNIO
O uso da violência como instrumento de dominação e desculpa para atingir objetivos escusos ou duvidosos; o uso de discursos políticos, ideológicos e filosóficos com a finalidade de confundir o raciocínio das pessoas e se manter no poder; a manipulação das informações a fim de esconder a verdade etc. Enfim, qualquer tipo de atitude que sirva para justificar a exploração do ser humano pelo próprio ser humano sempre me incomodou e a forma que eu uso para expressar a minha indignação contra isso é a arte.
Recentemente, a destruição das duas torres do WTC em Nova Iorque causou a morte de muitos inocentes, chocando o mundo ocidental que assistiu ao vivo cenas dantescas.
Em meu coração instalou-se a dicotomia de sentir-me chocado com a cruel violência visualmente exposta naquele ato e ao mesmo tempo revoltado com a violência dissimulada de alguns governantes, de uma superpotência e de países aliados, que desrespeitam os princípios mais básicos de convívio civilizado entre povos de diferentes culturas.
Infelizmente, esses hipócritas têm usado o sangue dos sacrificados como desculpa para continuar se mantendo no poder e continuar explorando diversos povos que vivem em locais estratégicos, econômica e militarmente, cometendo mais atrocidades e injustiças contra pessoas tão inocentes quanto as que morreram em setembro do ano passado.
O tríptico Nada de novo no Novo Milênio - II é o meu protesto contra estas atitudes que só aumentam o nível de violência e injustiça no mundo gerando mais insatisfação das populações exploradas e servindo de motivo para mais loucuras e atitudes desesperadas de minorias radicais. O resultado desse tipo de manipulação é sempre a morte de inocentes dos dois lados.
Essas atitudes e seus resultados não são novos, mas os líderes de diversos países (em ambos os lados dos conflitos) continuam usando inescrupulosamente o sangue dos inocentes para manter suas posições políticas, manter seus confortos materiais, aumentar seus lucros financeiros e justificar seus atos de violência contra povos e culturas que não entendem.
Nem mesmo a promessa de um mundo novo neste novo milênio tem sido capaz sensibilizar as lideranças do mundo em relação ao respeito humano e às diferenças culturais. Por isso mesmo, continuamos à mercê do antigo risco de guerras tradicionais, bacteriológicas ou até mesmo de uma hecatombe nuclear.
Uma parte do tríptico apresenta a bandeira americana estilizada de onde partem mísseis que ameaçam a cultura islâmica, representada pela lua crescente com a estrela, e outra parte apresenta dois aviões em queda livre que ameaçam a cultura ocidental, representada pela tocha da estátua da liberdade. Estas duas imagens são baseadas na argumentação das duas culturas (ocidental e islâmica). São duas visões antagônicas do mesmo problema, onde as duas partes se autodenominam libertadoras e chamam os inimigos de terroristas. É interessante notar que os discursos dos líderes de ambas as partes são tão iguais que, se pensarmos bem, eles se desmascaram mutuamente. Eles só continuam fingindo o papel de bonzinhos porque se sentem protegidos pelo sistema que defendem e porque muito de nós continuamos fingindo que não vemos esse teatro macabro onde os inocentes continuam pagando pelos pecadores.
Esse trabalho foi pintado sobre papelão de fabricação própria com as imagens sendo pintadas à mão ou editadas por meio de computação gráfica e as placas de computador foram serradas e esmerilhadas. A composição do tríptico é construtivista e segue os princípios matemáticos da relação áurea, uma relação matemática observada em várias criações da natureza e já encontrada nos estudos matemáticos dos povos da Antiguidade. Através dela, determinei os retângulos áureos e localizei vários pontos e áreas focais onde foram afixados os elementos simbólicos que representam diversas situações diretamente relacionadas com o tema da obra e que obrigam o espectador a examinar as relações metonímicas dos quadros, provocando-lhe questionamentos. Nesse sentido, as peças de computador representam o domínio da tecnologia na sociedade atual e que, muitas vezes, tem servido como instrumento de dominação pelos povos mais ricos.
Meu objetivo com minhas críticas sociais por meio da arte é provocar o espectador, usando uma linguagem artística e subjetiva. Para mim, o mais importante é a reflexão que o espectador leva consigo depois de observar meus trabalhos. Não sonho em transformar o mundo com meus questionamentos e nem pretendo mostrar que a arte pode eliminar a violência no mundo, mas gosto de provocar as pessoas para que elas tirem suas próprias conclusões sobre o tema abordado.
Quem tem olhos, que veja!
Walter Miranda – 2002/2003